sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Omissão



O aborto é um assunto que contempla grande discussão, de render bons argumentos. E o jornalismo medíocre utiliza-se desses assuntos não pela riqueza do debate que o envolve, mas sim pelo simples caráter polêmico e a atração gerada.

Apesar disso a reportagem aborda dados importantes, dados novos que retratam a questão do aborto no Brasil, como o número de 1 mulher para cada 5 já ter feito aborto em algum momento da vida, o que corresponde a 5 milhões de mulheres, ou um hospital que atende mais de 300 casos por mês de danos pós aborto.

Porém, condicionada mais uma vez ao sensacionalismo, a reportagem limita-se apenas a causar a identificação do receptor com o sentimento de repúdio comum ao aborto. Limitando também os questionamentos, que se mantêm na esfera moral ideológica, como: "Nossa, como são capazes disso?", "Como são frios!", "Como podem abortar?". E utilizando-se do recurso da informação pela metade, mediocremente conservam o receptor ao meio do caminho, deixando esvair o que realmente tanto quer nos mostrar esses dados: que já passou da hora do Estado começar a prestar o serviço do aborto e não mais deixar essa a responsabilidade nas mãos dos clandestinos.

Se está mais do que comprovada a enorme grandiosidade do universo do aborto, do aborto como experiência comum às mulheres comuns, das mulheres que morrem em mãos clandestinas, por que não é dito que a saúde pública não deve mais ser responsável apenas pelos socorros aos abortos mal feitos e sim por todo o serviço que o envolve. Que mesmo caçando as clínicas clandestinas surgirão outras, pois são estas que atendem à necessidade inevitável das mulheres de abortar, que são muitas, 1 para 5. Que as mulheres continuarão abortando, e que a proibição representa a destinação da prestação do serviço aborto aos açougueiros mercenários.

Será medo de faltar competência ou capacidade? Se há capacidade para atender 300 casos de pós aborto em um hospital público, que estes sejam a priori, para um aborto seguro que não resulte em mais sofrimentos para as mulheres e mais problemas para a saúde pública. Este já é um começo.

Parece ignorância, mas eles sabem, e alguns de nós sabemos também. É pura omissão e hipocrisia mesmo. Do governo, do jornalismo, da gente.




sábado, 17 de julho de 2010

A desgraça alheia



Este é o caso do momento, e sempre há de haver um caso policial do momento, dos últimos consigo lembrar de Richithofen, Eloá e Lindenberg, Isabela Nardoni e agora Bruno.

Já disse por aqui a respeito dessa nossa necessidade de consumir destruição e sofrimento, mas por quê? Por que consumimos tanto assim, a ponto de a mídia precisar ter sempre um caso de terror em pauta, sempre um que substitua o último já desgastado, que protagonize o noticiário que ainda têm algumas outras notícias que não possuem a mesma graça.

Esse gosto talvez se deva ao poder anestésico que o ultra-problema, extraordinariamente aterrorizante, tem sobre os nossos problemas, bom, que agora já são pequenos. Ou pelo efeito confortante da distância do problema. Ou pela relação comparativa e conclusão resultante de que diante de tamanha crueldade só podemos ser pessoas muito boas; mesmo com todos nossos defeitos, que agora também já são pequenos.

Mas não é esse o grande caso. Se você é feliz sem precisar desse santo remédio: a desgraça alheia. Se isto não ti pega; algum outro subterfúgio você utiliza. Bebida? Algum hobby? Algum esporte? Alguma pessoa? Qual é o seu recurso para ficar em paz e não pensar nos seus problemas?

Vou insistir no texto. Percebeu a relação? A mídia da desgraça alheia está para bebermos menos, praticarmos menos esporte ou conviver menos com as pessoas; e vice-versa.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

A novela

Partindo do pressuposto de que as mídias de massa são metaforicamente espelhos que refletem a cultura popular, é de se entristecer essa nossa necessidade de consumirmos desastres, conflitos, catástrofes, dor.

Este fato pode ser ilustrado pela insistência do telejornalismo em complementar notícias desgraçadas com depoimentos emocionados das vítimas ou próximos a elas.

Como a cereja que não poderia faltar ao bolo, o sensacionalismo faz da informação uma novela: mesma utilidade pública(entretenimento) e tão contínua e repetitiva quanto; seguem os capítulos conforme uma nova tragédia acontece; mudam os atores, porém o personagem é o mesmo.

O fato é deprimente, e ainda mais quando concluímos que os diretores das veiculações não são os culpados, eles apenas respeitam a função comercial da mídia, adequando a mensagem aos gostos dos expectadores. Nosso gosto! Por destruição e sofrimento.